Ordenação e renúncia
Ordenação e renúncia

O ciclo de estudos no ITESC se encerra no final de 1982 e Vilson Groh retornou a Brusque para a cerimônia de ordenação na Paróquia São Cristóvão.  Na ocasião, a casula utilizada foi a do tradicional estilo gótico, caracterizada pela leveza do tecido e pela faixa vertical, ou galão central, trabalhado em bordados de fina trama ornada com cachos de uva e com ramos de trigo dourados. A origem em latim da casulla, ou pequena casa, remonta ao significado da veste como um manto que protege o corpo. 

Padre Vilson lamenta que, justamente pela delicadeza com que a vestimenta é confeccionada, a sua casula originária não tenha resistido à ação do tempo e das traças, ao mesmo tempo em que se emociona por haver ganhado uma réplica que passou a utilizar nas celebrações. 

A partir da ordenação, no regresso a Florianópolis, em março de 1983, Vilson Groh vai morar na comunidade do Monte Serrat. 

“Aí começamos o movimento de luta nas periferias. Dentro desse processo eu passei a olhar a beleza dos olhares das crianças, a vivacidade, a ternura, o encanto. E a fazer esse contraste, na medida em que trabalhava com jovens, que iam sendo assassinados, e que eu tinha visto antes, pude entender que se a violência é aprendida, ela pode ser desaprendida.”

Desde aquele primeiro encontro com dona Claudete em 1978, o trabalho social junto à comunidade do morro foi a construção de um poço. No mesmo ano em que Vilson Groh conheceu o Mocotó, a comunidade vizinha do Monte Serrat fundava seu primeiro conselho comunitário. Mais tarde, quando o padre se muda para junto da comunidade, a rua principal foi pavimentada pela primeira vez na história da habitação do morro.

Neste período, padre Vilson frisa que houve uma relação mais próxima também com a Universidade, e relembra uma anedota muito interessante na discussão da cultura e dos saberes populares com o conhecimento técnico da academia. 

No momento da colocação das manilhas para contenção da água pluvial morro abaixo, seu Teco, um dos mais antigos (e amigos) moradores da comunidade do Monte Serrat e que, conforme frisa o padre Vilson, “conhecia bem mais o volume d’água do que o engenheiro”, disse:

— Não põe essa manilha que ela é muito pequena.

O engenheiro riu:

— Quem estudou a técnica fui eu e não o senhor, seu Teco. E eu sei que essa manilha vai dar conta.

Seu Teco limitou-se a responder:

— Deixa vir a chuva.

Na primeira chuva a rua toda veio abaixo.

Com o passar dos anos, Florianópolis passou a enfrentar o aumento da violência e o Monte Serrat ficou estigmatizado por um período marcado pela intensificação do tráfico de drogas. Em busca de alternativas, nasce uma parceria de trabalho de reforço escolar, aulas de artesanato e teatro. A educação como ferramenta de inclusão é mais uma bandeira a ser defendida. 

Mesmo diante das adversidades, Padre Vilson plantou uma semente que só fez germinar ao longo de quatro décadas de cultivo diário. Promoveu o acesso à educação para milhares de jovens e crianças de diversas comunidades para além do Monte Serrat. Também suas ações de capacitação comunitária renderam frutos que resultaram não só na melhoria de vida e infraestrutura no Morro, mas, principalmente, na construção da autoestima de pessoas, que aprenderam a força da conquista coletiva. Um trabalho que, uma vez semeado, seguirá sempre florescendo junto às comunidades. 

“Quando eu cheguei aqui o estudo não tinha valor. Hoje no morro o estudo tem um grande valor. Nos anos 1980, os pais diziam: por que meu filho vai estudar? Meu filho tem que trabalhar. Foi aí que começou a se dar importância a essa pauta do estudo como um valor, e hoje no Morro o estudo é uma busca que acontece cada vez mais.”

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